Fala-barato

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This is not a parrot

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O segredo de Estado, a violência doméstica e o corno

Finda a silly season, que em abono da verdade este ano foi mais silly do que é normal, digno-me a voltar às lides da escrita na certeza de que se não o fizesse dentro em breve seria erradicada deste Blog como se nunca nele tivesse existido. Os motivos do silêncio prolongado e prazeroso não foram, infelizmente, as tão merecidas férias, que essas ainda estão por chegar. Os motivos prenderam-se todos, sem excepção, com a pura estupefacção da qual fui acometida pelos desaires do Estado e pela incapacidade dos seus agentes de manterem segredos, pela falta de jeito do “novo” governo em lidar com alguns assuntos, pela sede de sangue da comunicação social, alimentada em larga medida pelo prazer que o povo português retira da desgraça alheia, e pela falta de respeito demonstrada pelo próximo.

Nos últimos meses tornou-se moda falar de segredo de Estado, a larga maioria das vezes sem se saber muito bem qual o verdadeiro alcance do conceito e quais as reais implicações da sua violação. Sim, porque até o leitor mais desatento e juridicamente desinformado saberá, a esta altura, que a violação do segredo de Estado consubstancia um crime punível com pena de prisão de 2 a 10 anos consoante o agente que o comete e as circunstâncias em que é praticado. Mas o que o incauto leitor pode não saber é que o segredo de Estado é um crime cuja prova se enquadra numa categoria que, desde os tempos da Faculdade de Direito, sempre me foi muito cara – a “diabólica probatio” (ou “probatio diabólica” para os mais puristas – eu, pessoalmente, prefiro a primeira) que consiste simplesmente numa grande dificuldade ou mesmo impossibilidade de provar o que se alega. A prova diabólica é, em suma, aquela que é praticamente impossível de realizar. Eis o que acontece com o crime de violação de segredo de Estado – como é que se prova o cometimento de um crime que, na minha modesta opinião, foi concebido de forma tão detalhada e tão cheia de conceitos indeterminados que cai no vazio de não poder ser provado?

E o que tem o crime de violação de segredo de Estado a ver com o crime de violência doméstica? Aparentemente, nada. Mas se colocarmos o Estado no lugar de vítima e os alegados violadores de segredo de Estado no lugar de agressores encontramos a analogia perfeita entre o Estado e a mulher que leva porrada do marido e que volta sempre para casa na esperança de que ele um dia há-de mudar.

E o corno? O corno, como sempre, são alguns dos intervenientes forçados nesta história de horrores que apanhados na curva de uma trapalhada institucional são, pasme-se, sempre os últimos a saber.

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